A carioca Brenda Costa, 33 anos, nasceu surda, porém, nunca gostou de se comunicar pela linguagem dos
sinais. Aprendeu a falar (coisa rara para quem não ouve), virou expert em
leitura labial (em várias línguas!) e ganhou o mundo como modelo - até
fotografou com Mario Testino. Mas também sofreu preconceito e foi humilhada por
sua condição física.
Há nove anos conheceu seu
príncipe, Karim Al-Fayed, surdo como ela e herdeiro de uma das
maiores fortunas do planeta. Eles têm uma filhinha perfeita. Sim, é exatamente
o que parece: um conto de fadas com final feliz! Aqui, ela conta um pouquinho
desta fábula moderna.
" Sou carioca, filha única e surda de
nascença - fato que nunca, gosto sempre de frisar, me impediu de realizar tudo
o que quis na vida: desde me comunicar no dia a dia até trabalhar, pagar minhas
contas, morar fora (em Nova York, Paris e Londres, onde resido hoje), namorar,
casar e criar uma filha linda. Sou uma das poucas surdas que conheço que fala.
É que o fato de não ouvir dificulta muito o processo de falar. Consigo me fazer
entender, ainda que não articule os sons com perfeição, e isso foi fundamental
para que eu realizasse tudo o que realizei. O fato de nunca ter estudado em
escola especial ajudou bastante. Desde novinha tive de me esforçar muito para
entender os amigos na escola, os professores... A vida toda conciliei rotina
escolar com sessões de terapia e fonoaudiologia. Também estudei leitura labial
e hoje, além do português, entendo francês, italiano e inglês.
Príncipe
Tive muitos golpes de sorte na vida...
Um dos maiores, melhores e que mais rendeu frutos foi conhecer num trabalho o
amor da minha vida, com quem esotu há nove anos: o Karim (Al-Fayed, egípcio,
filho do bilionário Mohamed Al-Fayed e irmão de Dodi, namorado da princesa
Diana que morreu com ela no acidente de 1997). Antes dele tive namorados,
claro, mas nunca com uma conexão assim! O Karim é fotógrafo e me conheceu numa
campanha. Ele ficou louco atrás do meu telefone e, como a agência fez jogo
duro, me escalou pra outra campanha, da Harrods, para poder me encontrar. O
resto você pode imaginar... me apaixonei - e a recíproca foi verdadeira! Ah,
faltou mencionar que o Karim também é deficiente auditivo. Ao contrário de mim,
ele não nasceu assim - sua surdez é resultado da meningite que teve quando
criança. Claro que essa coincidência terminou nos unindo. Nós dois conhecemos
bem a linguagem dos sinais, mas não gostamos de usar. Sabemos e preferimos ler
lábios em diferentes idiomas e temos a habilidade de falar - coisa que ele aprendeu
também depois de muitas sessões de fono.
O Karim é um homem importante e sinto o maior orgulho disso, embora para
mim ele seja "só" pai da nossa Antônia, hoje com 5 anos, e meu marido
- um homem encantador, superprotetor, carinhoso e gentil. Se eu puder citar uma
parte chata dessa história toda é que, às vezes, preciso bloquear minha agenda
como modelo para poder aomcpanhá-lo nos compromissos (Karim atua como
fotógrafo, é diretor de fotografia de cinema e, bem, herdeiro de uma das
maiores fortunas do planeta). É assim quando se é mulher de alguém tão
ocupado, fazer o quê? Isso me machuca um pouco, porque eu amo ser modelo, adoro
trabalhar... Mas não se pode ter tudo, né?
Minha mãe, minha filha, minha voz
Minha mãe, minha filha, minha voz
Para falar a verdade, sinto que tenho quase tudo. Antônia veio coroar lindamente minha história de superação. Nunca temi que ela tivesse deficiência auditiva. Graças a Deus, minha filha escuta bem e nos entende perfeitamente. Como explicar isso? Parace que desde bebê ela sabe que não escutamos... Quando queria chamar nossa atenção, intuitivamente nos tocava, em vez de emitir sons, como fazem as crianças. Hoje, nos avisa quando a campainha ou o telefone da casa estão tocando. Antônia não conhece a língua dos sinais, mas fala inglês e português e gesticula muito bem. Nossa comunicação - minha, dela e do Karim - se dá por uma linguagem corporal única, que fomos criando naturalmente.
Tento fazer tudo o que posso pela minha
filha: dou banho, levo e busco na escola, brinco, faço o dever de casa... Quero
ser para ela o que minha mãe foi pra mim. Minha mãe sempre foi minha voz, um
pedaço meu. Quando viajo a trabalho, fico doida querendo entrar no Skype pra
ver a Antônia, para mostrar o que estou fazendo. Amo quando ela fica imitando
minhas poses de modelo!
E o dinheiro?
Hoje, aos 31 anos, não sinto mais dificuldades ou preconceito por ser surda. Superei minhas inseguranças e me acostumei a viver dentro das minhas limitações. Vez ou outra me dizem que é fácil sentir essa aceitação toda porque tenho dinheiro. Bem, de fato o dinheiro é uma ferramenta para deixar a vida mais confortável e me ajudou muito a melhorar a minha comunicação. Afinal, fiz todos os tratamentos possíveis para poder falar e, em 2066, coloquei um implante coclear, uma cirurgia caríssima que proporciona uma leve sensação auditiva - como esquecer o som do vento, a primeira coisa que ouvi? Ou a primeira vez que minha mãe disse o meu nome?
Mas com ou sem dinheiro, uma coisa eu aprendi nesta vida: a gente
precisa passar por cima das barreiras e lutar pelo que quer. Pode parecer bobo e
óbvio, porém minha história prova que é possível. Mais: que vale a pena. Quero
um dia trabalhar em uma ONG brasileira e fazer campanhas para mostrar que os
deficientes auditivos podem vencer, ter sucesso em suas profissões, se
superarem também no âmbito pessoal. Quero ver alguém dizer não.
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